quinta-feira, 12 de maio de 2016

"Redução de ministérios é oportunidade para reestruturar a AGU", por Vanessa Affonso Rocha (Opinião, Consultor Jurídico de 12/05/2016)

A decisão do presidente da República interino, Michel Temer, de reduzir de 32 para 24 o número de ministérios inclui duas mudanças que dizem respeito à Advocacia-Geral da União: a revogação do status de ministro de Estado para o advogado-geral da União e a incorporação da temática da Previdência Social pelo Ministério da Fazenda [1] .

No tocante ao status de ministério, vale ressaltar a flagrante inconstitucionalidade da previsão legal que coloca o advogado-geral da União como integrante da Presidência da República e atribui a ele a condição de ministro de Estado, tudo nos termos da Lei 10.683/03. Ora, o advogado-geral não pode integrar a Presidência da República, muito menos ostentar a qualidade de ministro de Estado, simplesmente porque se trata de autoridade expressamente prevista pela Constituição da República como chefe máximo da AGU, função essencial à Justiça, com requisitos e sistemática próprios, que não se confundem com a sistemática aplicável aos ministérios. Um ministério pode ser criado ou extinto por lei ordinária ou mesmo medida provisória, o que por óbvio não se aplica à AGU, que, repita-se, está expressamente prevista na Constituição, artigo 131, em capítulo separado dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, tendo sua organização e seu funcionamento regidos necessariamente por lei complementar. E cumpre registrar, ainda, que a nossa Lei Maior exige do advogado-geral da União o mínimo de 35 anos, notável saber jurídico e reputação ilibada, requisitos esses que não se aplicam aos ministros de Estado, para os quais bastam a idade de 21 anos e o exercício dos direitos políticos.

Ou seja, a referida previsão legal, longe de representar um status  diferenciado, representa verdadeira e inconstitucionalcapiti diminutio institucional, configurando-se a redução de uma instituição com atribuições próprias e constitucionalmente previstas ao nível de um ministério, órgão que caracteriza tão somente uma longa manus do presidente da República.

Assim, revogar a Lei 10.683/03 na parte em que confere status de ministro de Estado ao advogado-geral é medida que vai ao encontro da nossa Constituição. Todavia, a mesma lei, ou medida provisória, que trouxer essa revogação deve vir acompanhada da confirmação expresso da autonomia administrativa e financeira da AGU, que já é presente no ordenamento jurídico, na esteira do que prevê o artigo 9º da Lei 10.480/2002. O referido dispositivo legal expressamente vinculou a Procuradoria-Geral Federal à AGU, garantindo, todavia, autonomia administrativa e financeira ao órgão vinculado. Ora, é evidente que a instituição que vincula também detém essa necessária autonomia administrativa e financeira, sob pena de inadmissível superioridade administrativa de órgão vinculado em relação à instituição vinculante.

Dessa feita, confia-se que a mesma lei que extirpará do ordenamento jurídico a previsão de status de ministro de Estado ao advogado-geral da União também confirmará expressamente a autonomia administrativa e financeira da instituição AGU, no sentido de se esclarecer, reforçar e confirmar situação já existente e presente no ordenamento jurídico.

No mesmo sentido, tem-se que a oportunidade de confirmação do status institucional da AGU é adequada para o trato de outro tema premente e que também diz respeito às modificações vindouras no governo que se avizinha: a unificação das carreiras jurídicas que hoje integram a AGU. E a ligação desse tema com a revisão ministerial vindoura está na provável incorporação da matéria previdenciária pelo Ministério da Fazenda.

caput do artigo 131 da Constituição prevê que a AGU é a instituição que, diretamente ou por meio de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre a sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo. O parágrafo 2º do mesmo artigo prevê que o ingresso nas classes iniciais das carreiras da AGU se dá por concurso de provas e títulos, e o parágrafo 3º prevê a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional como responsável pela representação da União na execução da dívida ativa de natureza tributária. E, por fim, o artigo 29 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias prevê que, “enquanto não aprovadas as leis complementares relativas ao Ministério Público e à Advocacia-Geral da União, o Ministério Público Federal, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, as Consultorias Jurídicas dos Ministérios, as Procuradorias e Departamentos Jurídicos de autarquias federais com representação própria e os membros das Procuradorias das Universidades fundacionais públicas continuarão a exercer suas atividades na área das respectivas atribuições”. É desse arcabouço constitucional que decorre a formatação atual da AGU.

O conjunto de normas constitucionais sobre o tema deixa claro que a AGU deve abarcar a representação judicial e extrajudicial da União, inclusive na execução  da dívida ativa de natureza tributária, e de suas entidades autárquicas e fundacionais, cujos quadros anteriores à Constituição foram preservados pelo artigo 29 do ADCT até que sobreviesse a lei complementar relativa à AGU. E o mesmo conjunto normativo revela que a Constituição previu a PGFN como um órgão que necessariamente estaria presente na estrutura da instituição AGU. Nessa linha, a LC 73/93 previu a PGFN entre os órgãos superiores da AGU (artigo 2º, inciso I, “a”) e previu as procuradorias e departamentos jurídicos das autarquias e fundações públicas como órgãos vinculados à AGU (artigo 2º, parágrafo 3º). Percebe-se que a opção do legislador foi manter procuradorias e departamentos jurídicos de autarquias e fundações públicas como órgãos vinculados à AGU, conforme faculta o artigo 131 da Constituição, ou seja, integrantes da AGU por vinculação. Todo o mais foi incorporado à AGU como órgão diretamente integrante, inclusive a PGFN. Portanto, e apenas por isso, foram previstos na LC 73 como membros da AGU os integrantes das carreiras de advogado da União, procurador da Fazenda Nacional e assistente jurídico, por serem eles os membros atuantes nos órgãos diretamente integrantes da AGU. Acerca do tema, vale remeter o leitor para artigo da lavra dos procuradores federais Carlos André Studart Pereira e Ricardo Marques de Almeida [2] .

Como se está aqui a tratar de uma vindoura redução de ministérios por lei ordinária ou medida provisória, deve-se consignar a plena possibilidade de se efetivar a unificação das carreiras jurídicas integrantes da AGU por essa via legislativa. E aqui a confirmação é empírica e já foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 2.713-1, de relatoria da ministra Ellen Gracie:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 11 E PARÁGRAFOS DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 43, DE 25.06.2002, CONVERTIDA NA LEI Nº 10.549, DE 13.11.2002. TRANSFORMAÇÃO DE CARGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO DA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO EM CARGOS DE ADVOGADO DA UNIÃO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 131, CAPUT; 62, § 1º, III; 37, II E 131, § 2º, TODOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. [...] Não encontra guarida, na doutrina e na jurisprudência, a pretensão da requerente de violação ao art. 131, caput da Carta Magna, uma vez que os preceitos impugnados não afrontam a reserva de lei complementar exigida no disciplinamento da organização e do funcionamento da Advocacia-Geral da União. Precedente: ADI nº 449, Rel. Min. Carlos Velloso. Rejeição, ademais, da alegação de violação ao princípio do concurso público (CF, arts. 37, II e 131, § 2º). É que a análise do regime normativo das carreiras da AGU em exame apontam para uma racionalização, no âmbito da AGU, do desempenho de seu papel constitucional por meio de uma completa identidade substancial entre os cargos em exame, verificada a compatibilidade funcional e remuneratória, além da equivalência dos requisitos exigidos em concurso. Precedente: ADI nº 1.591, Rel. Min. Octavio Gallotti. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

A partir desse julgado, consagrou-se o entendimento de que a exigência constitucional de LC para a organização e funcionamento da AGU não alcança a regulamentação das carreiras integrantes da instituição. Assim, confirma-se o cabimento da transformação de cargos ora defendida por lei ordinária ou medida provisória.

A Medida Provisória 2.048-26/00 criou a carreira de procurador federal, transformando em cargos de procurador federal diversos cargos efetivos existentes em entidades da administração indireta, excluídos os cargos de procurador do Banco Central, por mera escolha discricionária do legislador, sem qualquer razão aparente, o que acabou por preservar a Procuradoria-Geral do Banco Central do Brasil como órgão autônomo e vinculado à AGU, conforme previsão da LC 73/93.

A referida MP 2.048-26/00 atribuiu ao advogado-geral inclusive lotação e distribuição dos membros da carreira de procurador federal, bem como a edição dos atos necessários ao cumprimento do disposto na MP, relativamente aos cargos da AGU e àqueles integrantes de seus órgãos vinculados, tudo conforme artigos 37, parágrafo 1º, e 50. E também se observa aqui a equiparação de vencimentos de todos os cargos de carreiras integrantes da AGU, conforme artigos 41 e 44 da MP em apreço.

No tocante à identidade de atribuições, a legislação vigente já a deixa inconteste. Os exemplos mais contundentes estão na Lei 9.028/1995, em seus artigos 8º-D,caput, e parágrafo 5º, 11-A e 11-B, ambos na íntegra. Esses dispositivos são fecundos em prever hipóteses de atuação dos membros da AGU em atribuições típicas de outra carreira que, embora também integrada à AGU, não seja a sua. Permite-se, assim, a atuação de procuradores federais em órgãos de lotação de advogados da União, a exemplo dos núcleos de assessoramento jurídico, hoje consultorias jurídicas da União. Bem como se permite a representação judicial de autarquias e fundações públicas, órgãos de lotação de procuradores federais, por advogados da União e procuradores da Fazenda Nacional, assim como a alocação desses membros em órgãos jurídicos das entidades autárquicas.

Cumpre salientar que a PGF, órgão da administração federal direta vinculado diretamente à AGU, somente foi criada em 2002, com a Lei 10.480/02. Ou seja, a carreira de procurador federal foi criada em 2000, antes da criação do órgão PGF, de modo que os cargos de procurador federal estavam, em sua origem, diretamente vinculados à AGU, tendo passado para o quadro próprio da PGF apenas em 2002, com o artigo 12 da referida lei.

Portanto, percebe-se que estão claramente presentes os requisitos necessários à transformação de cargos, bem como está clara a opção normativa por se viabilizar a atuação de uma carreira em atribuições típicas de outra. Vê-se, pois, que a especialização que se poderia sustentar como razão para a existência de várias carreiras não se sustenta pelo arcabouço legal já vigente, bem como é confirmada pela revisão ministerial que se avizinha, senão vejamos.

A revisão ministerial noticiada pela imprensa dá conta de que a matéria previdenciária seria incorporada ao Ministério da Fazenda, o que a levaria para o âmbito de atuação dos procuradores da Fazenda Nacional, que são hoje responsáveis pelas atividades de consultoria e assessoramento jurídico no âmbito daquele ministério. Hoje, a matéria previdenciária na administração direta é manejada por advogados da União que atuam no Ministério do Trabalho e Previdência Social, sabendo-se ainda que a mesma matéria é manejada por procuradores federais quando da execução das políticas públicas pelo Instituto Nacional do Seguro Social. Ou seja, é cabal, patente, inegável e óbvia a absoluta confusão de atribuições entre as carreiras jurídicas hoje integrantes da AGU, cuja multiplicidade serve tão somente para engessar, burocratizar e atrasar o desenvolvimento dessa tão importante Instituição de Estado.

A prática da administração pública federal no Brasil evidencia a eficiência na fusão de carreiras, como já ocorreu no âmbito dos ciclos de gestão e da Receita Federal do Brasil. Ademais, a fusão das carreiras hoje integrantes da AGU, diretamente ou por órgãos vinculados, representará o fortalecimento da solução administrativa de eventuais conflitos entre órgãos da União e entidades a ela vinculadas, conforme abalizada doutrina do advogado da União Manuel de Medeiros Dantas, que traz lições precisas e pertinentes para o tema em apreço [3] .

Portanto, restam inegavelmente presentes os requisitos para a transformação de cargos pretendida. E os benefícios oriundos da transformação de cargos em apreço são objetivos e inegáveis, com elevado potencial de racionalização e otimização da atuação dos órgãos de execução da AGU, o que vai ao encontro da necessária e urgente reestruturação da administração pública federal, com aumento de eficiência e redução de gastos. Com relação aos benefícios da chamada unificação de carreiras da AGU, remete-se para a lição do procurador federal Lênio Mercês Sampaio, que pode ser resumida nos seguintes resultados diretos: 1) racionalização do conteúdo do trabalho; 2) otimização da força de trabalho; 3) economia de estruturas nas localidades onde há representação da AGU; e 4) melhor compreensão por parte da sociedade do papel da Advocacia-Geral da União [4] .

Outrossim, também é necessário destacar que a medida vai ao encontro do desejo da maioria dos membros das carreiras atualmente integrantes da AGU, conforme pesquisa institucional feita no ano de 2015 e disponível no sítio eletrônico oficial da instituição [5] . Conforme a referida pesquisa institucional, o nome mais adequado para a carreira a ser criada seria o de procurador da União.

Assim, conclui-se pela caracterização de oportunidade única de se iniciar o caminho de reestruturação da AGU como instituição, por intermédio: 1) da revogação do inconstitucional status de ministro de Estado atribuído ao advogado-geral da União, acompanhada do reforço da autonomia administrativa e orçamentária da instituição AGU, por disposição legal expressa; e 2) da criação do cargo de procurador da União, como resultado da transformação dos quatro cargos que hoje integram a AGU, com o objetivo precípuo de otimizar a atuação da AGU, em homenagem aos princípios e diretrizes mais caros à administração pública moderna.

[1] Notícia disponível emhttp://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/05/1769359-temer-decide-cortar-pelo-menos-nove-ministerios.shtml , dentre outras fontes.

[2] Disponível emhttp://www.conjur.com.br/2015-out-11/unificacao-carreiras-agu-ajudaria-governo-ajuste-fiscal .

[3] Disponível em <http://www.conjur.com.br/2004-out-11/segmentacao_carreiras_juridicas_provoca_alguns_absurdos>. Acesso em 25 maio 2014)

[4]  Disponível emhttp://jus.com.br/artigos/35361/desmistificando-a-unificacao-das-carreiras-da-advocacia-publica-federal/3?secure=true

[5]http://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/372377

Vanessa Affonso Rocha  é advogada da União.

Revista Consultor Jurídico , 12 de maio de 2016, 18h01

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

EMENDA SUBSTITUTIVA AO PROJETO DE LEI NºXX/2015 (Unificação de Carreiras da AGU)

PROJETO DE LEI NºXXXX/2015 (Unificação de Carreiras)

EMENDA SUBSTITUTIVA

Dê-se a seguinte redação ao Projeto de Lei nº XXXX/2015:

"Art.2º. ...
Parágrafo único. O concurso público para ingresso na carreira de Procurador da União deve exigir todos os requisitos de capacitação e de conhecimento específico necessários para o bom desempenho das funções em relação a todos os órgãos e entes públicos federais, conforme ato do Conselho Superior da Advocacia-Geral da União, ouvidos esses órgãos e entes sempre que manifestarem interesse.

Art.7º. Pelo prazo de 10 (dez) anos contados da edição desta Lei, nos concursos de remoção, as listas de antiguidade e de preferência de lotação serão organizadas por carreira de origem.
§1º. ... 
§2º. ...


Art.8º. A Escola da Advocacia-Geral da União manterá em caráter permanente cursos de formação e capacitação para os Procuradores da União, visando atender as necessidades de especialização e atualização dos órgãos e entes públicos federais atendidos pela Advocacia-Geral da União, ouvidos esses órgãos e entes sempre que manifestarem interesse.

Art.13. As folhas de pagamento dos membros oriundos das extintas Carreiras de Procurador da Fazenda Nacional e de Procurador do Banco Central do Brasil serão transferidas, respectivamente, do Ministério da Fazenda e do Banco Central do Brasil para a Advocacia-Geral da União, com a transferência dos correspondentes recursos orçamentários.
Parágrafo único. ...

Art.15. O apoio técnico e administrativo aos órgãos da Advocacia-Geral da União que funcionam junto aos Ministérios, órgão da Presidência da República, autarquia e fundações públicas federais, continuará a ser prestado por esses órgãos e entidades, até que o apoio possa ser assumido de forma definitiva pela Advocacia-Geral da União com a transferência dos respectivos recursos orçamentários e com a nomeação suficiente de pessoal de apoio do PEC-AGU."


EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

As alterações acima propostas observam algumas demandas que há muito tempo têm sido apresentadas a este Congresso Nacional pelos membros da Advocacia-Geral da União; por outro lado, evitam alguns retrocessos que poderiam eventualmente ocorrer com a redação original do Projeto de Lei.
Primeiramente, o art.2º prevê na redação original a possibilidade de concurso específico por área de especialização. Como é de conhecimento de todos, em 2015 o Movimento de Valorização da AGU que eclodiu em todo o país acabou trazendo à pauta a unificação das 4 (quatro) carreiras de advogados públicos federais, e no seio desse movimento prevalece a concepção de que todos são advogados capacitados a prestar o serviço jurídico que qualquer órgão público federal necessitar, judicial ou extrajudicialmente, de modo que não há razão para que, num processo de unificação, mantenha-se a atual distinção (puramente) formal entre os membros, como se a capacidade técnica de cada um decorresse exlusivamente de essa ou aquela disciplina jurídica ser cobrada no concurso, e não de sua experiência e envolvimento com o trabalho advocatício diário em cada unidade, conforme exigem as demandas do cliente público. Com efeito, a prova de um concurso público é um definidor inicial da capacitação de um advogado público; e no caso da nova Carreira de Procurador da União, essa capacitação inicial para prestar serviços jurídicos para todos os entes públicos federais pode muito bem ser garantida através de um concurso público que preveja todas as disciplinas jurídicas que envolvem esses entes públicos federais.
No art.7º, a fim de resguardar os interesses dos atuais membros em momento de transição, e considerando que são muitas as unidades (notadamente no Nordeste e Sudeste do Brasil) em que a fila de espera por uma vaga ultrapassa 5 anos, parece mais razoável estabelecer o prazo limite em 10 anos, sendo esta a única alteração realizada.
Quanto ao art.8º, as razões referidas quanto ao art.2º aplicam-se, mutatis mutandis, para esta alteração. Acrescento que não há razão para que o Ministério da Fazenda e o Banco Central do Brasil, como órgãos puramente administrativos, intervenham na Advocacia-Geral da União para determinar qual advogado tem ou não tem capacidade jurídica para exercer a sua profissão de advogado. Com efeito, permitir a legalização de uma intervenção como esta parece até mesmo inconstitucional, tendo em vista a condição da AGU de Função Essencial à Justiça. Assim, o art.8ª foi alterado para prever que eventuais conhecimentos específicos que possam ser necessários para prestar serviços jurídicos para um ou outro ente federal poderão ser normalmente passados aos Procuradores da União através de cursos admnistrados pela Escola da AGU.
Em relação ao art.13, a alteração deveu-se ao fato de que não há necessidade de se aguardar sine die a transferência da folha de pagamento do Ministério da Fazenda e do Banco Central do Brasil para a Advocacia-Geral da União; com efeito, há sim uma limitação natural de transferência de dados e reorganização administrativa nos setores de Recursos Humanos dos entes, mas para isso não é necessário que a lei unificadora das carreiras preveja um adiamento sem prazo final para essa transferência.
Por fim, quanto ao art.15, a mesma ressalva feita ao art.13: não há razão para a previsão de manutenção do status quo da carreira de apoio da AGU, que se sabe ser absolutamente insuficiente, até porque é quase inteiramente prestada por servidores cedidos por outros órgãos. Desse modo, propõe-se a previsão expressa de que essa situação somente perdurará até a implementação de um Plano de Carreira de Servidores de Apoio da AGU que satisfaça as necessidades do serviço.



Brasília, 07 de janeiro de 2015.

Deputado XXXX XXXXX

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Análise jurídica da Unificação das carreiras da AGU

 Sem ter a pretensão de esgotar o tema, mas a fim de contribuir com esclarecimentos que alguns colegas podem achar necessário, segue a exposição abaixo, feita com a ajuda de outro colega:

A) TEXTO CONSTITUCIONAL

 Artigo 131 do CF prevê:
- um grande órgão: AGU
- uma Procuradoria específica, portanto, outro órgão: PGFN
- a necessidade uma Lei Complementar para tratar de ORGANIZAÇÃO e FUNCIONAMENTO

Primeira conclusão: 
não existe previsão de nenhumas das carreiras na Constituição, apenas de órgãos. Portanto, a unificação de carreiras, mantidos os órgãos como são hoje, não exige Emenda Constitucional, pelo menos em princípio.

Seguindo, será que necessita Lei Complementar? Para responder a essa pergunta, devemos saber se "organização e funcionamento" inclui:
-criação,
-transformação,
-transposição,
-extinção de cargos.

A interpretação para isso consta da decisão do STF proferida na ADI 2713, que tratou da transposição dos membros da carreira de Assistente Jurídico para a de Advogado da União.

B) ADI 2713 

A unificação de cargos não viola o art. 131 da CF porque é necessária "uma maior liberdade de atuação legislativa no que diz respeito ao planejamento e à racionalização do quadro de pessoal da Instituição, (...) diante do dinamismo da realidade".
Também não viola o princípio do concurso público, desde que preencha 4 requisitos (são citados como razões de decidir outros dois precedentes do STF:ADI 449, Rel. Min. Carlos Velloso, e ADI 1.591, Rel. Min. Octavio Gallott):
1-compatibilidade funcional - verificada a partir da existência de intercâmbio entre os membros das carreiras, o que sabemos é muito comum tanto nos órgãos consultivos, onde encontramos membros de todos as quatro carreiras exercendo as mesmas funções lado a lado; como nas Procuradorias, inclusive temos como exemplo o próprio AGU, que trabalhou por um bom tempo na PRU da 4ª Região. Além disso, temos o exemplo da instalação das primeiras 150 PSU do Brasil, todas ocupadas inicialmente por Procuradores da Fazenda Nacional. 2-compatibilidade remuneratória - devem ter a mesma remuneração, como ocorre hoje entre as quatro carreiras 3-equivalência dos requisitos para prestar o concurso - não se trata de matérias que caem nas provas, mas de requisitos para prestar o concurso, isto é, mesma escolaridade, mesma formação, etc. As quatro carreiras da AGU possuem o mesmo sistema de provas e títulos.
4-completa identidade substancial entre os cargos

Aqui é a maior resistência de quem é contrário à unificação, especialmente por causa da atuação dos Procuradores Federais, que seria direcionada "apenas à defesa de autarquia e fundações". 

4.1)
Contudo, o STF neste leading case fez a análise da "identidade substancial" a partir das funções previstas para cada uma das carreiras na Lei. No caso dos PFs, tem-se a MP2229/2001, que criou a carreira de Procurador Federal, dispondo em seu art.37:

São atribuições dos Procuradores Federais:
I - a representação judicial e extrajudicial da União, quanto às suas atividades descentralizadas a cargo de autarquias e fundações públicas, bem como a representação judicial e extrajudicial dessas entidades;
II - as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos à União, em suas referidas atividades descentralizadas, assim como às autarquias e às fundações federais;

[Similaridade entre Advogados da União e Procuradores Federais)
III - a apuração da liquidez e certeza dos créditos,(...) inscrevendo-os em dívida ativa (...);
[Similaridade entre Procuradores da Fazenda Nacional e Procuradores Federais]

4.2)
 Nesse ponto, mais uma vez poderiam alguns contrários à unificação dizer que, embora a MP fale que os Procuradores Federais têm a função de "defender a União", isso seria apenas jogo de palavras, pois as autarquias e as fundações não poderiam se confundir com a União órgão central, o que incluiria representantes jurídicas dessas entidades. Em resposta a isso, teríamos de fugir da forma de decidir fixada pelo STF. Mas podemos sim ir adiante, a bem do debate. Digamos que o STF reveja a posição desse precedente dos Assistentes Jurídicos e decida não apenas analisar a lei que estabelece as funções de cada cargo, mas tente analisar o que realmente cada carreira faz. 

Primeiro:
essa autonomia não está prevista na Constituição, mas nas leis, e os conceitos utilizados vêm na maior parte da Doutrina.

Segundo:
a autonomia que é garantida às autarquias e às fundações (deixando de lado o próprio equívoco do termo "autonomia" para o caso) é exclusivamente para AUTO-ADMINISTRAÇÃO DE SUAS ATIVIDADES, a AUTONOMIA GERENCIAL.


 
Consultando os maiores administrativistas do Brasil, tais como Hely Lopes Meirelles, Maria Di Pietro e outros, como não poderia ser diferente, em nenhum momento se encontra qualquer afirmação no sentido de que a prestação do serviço jurídico faria parte da autonomia de administração, a autonomia gerencial. Portanto, a não ser que queira se inventar o Direito, a prestação do serviço jurídico não faz parte da autonomia gerencial garantida às autarquias e fundações.

E por que "não poderia ser diferente"? Porque a prestação do serviço jurídico é especial em relação a qualquer outra atividade do seu empregador, seja esse empregador a União ente central, seja esse empregador uma autarquia ou fundação, seja esse empregador uma pessoa jurídica privada qualquer. Com efeito, todo advogado, privado ou público, possui INDEPENDÊNCIA TÉCNICA para o exercício de suas atividades. Isso é garantido expressamente em favor dos advogados empregados  (art.18 da LOAB- Art. 18. A relação de emprego, na qualidade de advogado, não retira a isenção técnica nem reduz a independência profissional inerentes à advocacia), para acabar com qualquer dúvidas que poderiam existir quanto a esse ponto.

Ou seja, sabendo que o advogado presta o serviço de defesa jurídica de interesses em juízo e de consultoria e assessoramento, jamais um advogado como é o Procurador Federal poderia ser considerado como submetido à gerência autônoma de um chefe de autarquia, por exemplo, pois a autarquia nada mais é do que um cliente do Procurador Federal (e são muitos, mais de 100 autarquias e fundações), que vai até ele em busca de serviço jurídico para auxiliar em sua atividade-fim, mas isso em nenhum momento retira desse Procurador Federal a total independência técnica, e não o submete de forma alguma à gerência das autarquias, como se fosse um técnico qualquer. Repito: os advogados e procuradores não são qualquer empregado, são diferenciados e possuem independência técnica, não submetendo de forma alguma o seu trabalho à gerência, seja da autarquia, seja da União ente central.

Apesar de já ser suficiente, é possível avançar ainda mais no argumento: essa autonomia técnica é ainda mais gritante na Administração Pública. Tanto União ente central, quanto autarquia, quanto universidades, obedecem a LEGALIDADE ESTRITA; ou seja, as autarquias não podem fazer nada que não esteja previsto na legislação; e os Procuradores Federais não podem interpretar em favor do seu cliente nada do que esteja fora da legislação. 
Desse modo, onde poderia haver espaço para um administrador de autarquia, universidade ou qualquer outro utilizar-se de sua autonomia gerencial e solicitar que um Procurador Federal prestasse o serviço jurídico desse ou daquele modo? Esse espaço não existe.

Na prática, no dia-a-dia, basta lembrar que, quando fazemos uma peça, seja um parecer, seja uma contestação, não pensamos "como o governo quer isso e aquilo, vou escrever tal coisa". Com efeito, analisamos as leis que se aplicam ao caso e tentamos interpretá-las da forma mais favorável ao nosso cliente, não interessa quem ele seja. Essa é a função de um advogado e é o que fazemos diariamente, sob pena de responsabilização civil, criminal e administrativa. No caso dos advogados públicos, isso é a independência técnica trabalhando dentro dos limites da legalidade estrita. 
Desse modo, tendo em vista então que os serviços jurídicos definitivamente não compõem a estrutura essencial de uma autarquia ou fundação, nem mesmo da estrutura da Administração da União como ente central, pois eles são prestados por advogados, atualmente em 4 carreiras, que possuem autonomia técnica por força da Lei da OAB e da própria natureza da atividade histórica da advocacia, então conclui-se facilmente que a essência, a substância de todas as 4 carreiras é a mesma: defesa de interesses públicos federais em Juízo e consultoria e assessoramento de entes federais extrajudicialmente. Desse modo, há identidade substancial entre os cargos, permitindo a unificação também por esse critério.
4.3)
Portanto, em conclusão, com base no precedente acima, seria possível a unificação das carreiras da AGU por MP-LO, desde que mantidas as estruturas organizacionais, que dependem de LC e/ou EC.
 

C) ADI 484

Estavam sendo impugnadas duas leis estaduais do Estado do Paraná que organizavam, numa carreira de Advogado Especial do Estado do Paraná, aqueles advogados, assistentes jurídicos etc. que, na época da promulgação da Constituição do Estado do Paraná, prestavam assessoramento jurídico aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e representavam as autarquias e fundações públicas.

A ADI foi julgada improcedente, tendo em vista que as leis apenas criavam a referida carreira para acomodar esses que exerciam, na época da promulgação da CE, aquelas atividades já referidas. Entendeu-se que essa carreira de Advogado Especial não poderia receber novos membros por concurso público, pois isso significaria usurpar definitivamente competências dos Procuradores do Estado do Paraná. 
Não parece ter peso contra a unificação. Pelo contrário, a criação dessa carreira de advogado especial veio somente para acomodar uma situação transitória, que deixaria de existir tão logo os ocupantes desses cargos viessem a se aposentar. A partir de então, as atribuições seriam dos Procuradores do Estado, carreira única, inclusive as de consultoria e assessoramento jurídicos às autarquias e fundações e a respectiva representação judicial dessas entidades.


D) ADI 3415

Nesse caso, a notícia no site do Supremo fala por si mesma. Era um caso de unificação de cargo de comissário de polícia com o de delegado. Pura falácia de quem quer comparar coisas absolutamente diferentes:

Quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Unificação das carreiras de delegado e comissário de polícia no AM é inconstitucional

O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucionais normas do Estado do Amazonas que unificaram as carreiras de delegado de polícia e comissário. Segundo o entendimento adotado pela Corte no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3415, a medida representou burla à exigência do concurso público.

“Muito diversamente do que houve nos precedentes em que este Supremo Tribunal Federal admitiu a unificação de carreiras, quando se apurou que a distinção entre os cargos fusionados era meramente nominal, há aqui substanciais diferenças entre um e outro”, afirmou o relator da ADI, ministro Teori Zavascki. Criado por meio de lei editada em 2001, o cargo de comissário, além de ter remuneração muito inferior à do cargo de delegado de polícia, apresentava natureza isolada, organizando-se em classe única.

O cargo surgiu com exigências semelhantes ao de delegado, como formação superior em Direito, inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e curso na academia de polícia. Entre as atribuições do cargo, havia a previsão, de forma excepcional, do exercício de funções de delegado de Polícia no interior ou de delegado plantonista. Contudo, as Leis estaduais 2.875/2004 e 2.917/2004 instituíram um grupo ocupacional denominado de autoridade policial, composto por titulares dos cargos de delegado e de comissário, conferindo-lhes atribuições idênticas e equiparando a remuneração de comissário à de delegado da 5ª Classe.

Segundo o argumento adotado pelo relator, as diferenças entre os cargos não são irrisórias, existindo subordinação hierárquica e não cabendo ao comissário a chefia da delegacia de polícia, a não ser em caráter temporário. Há uma diferença de responsabilidades e de perspectiva de promoções. Aqueles que prestaram o primeiro concurso para o cargo em 2001, diz o relator, tinham ciência das limitações da função.

“Não tem credibilidade a afirmação de que as leis impugnadas operaram mera racionalização administrativa dos quadros da polícia do Estado do Amazonas. A forma como foi conduzido o rearranjo administrativo revela que houve de fato burla ao postulado do concurso público”, concluiu.

O voto do ministro Teori Zavascki, pela inconstitucionalidade de dispositivos das Leis estaduais 2.875/2004 e 2.917/2004, nos termos do pedido feito pela Procuradoria Geral da República (autora da ADI), foi acompanhado por unanimidade.



E) ADI 3857

Impugnava lei do Estado do Ceará que realizava a transposição de cargos de auditor adjunto e de técnico da fazenda estadual para um novo cargo de Auditor Adjunto.

O problema, aqui, foi que os cargos anteriores possuíam atribuições distintas da do novo, remuneração distinta (inclusive entre os dois antigos), além de possuir requisito de escolaridade diferente (nas antigas, nível médio; na nova, nível superior).

Assim, o STF considerou que se tratava de burla ao princípio do concurso público, já que o novo cargo tinha atribuições distintas, requisito de ingresso distinto etc.

Ou seja, totalmente diferente da unificação que se pretende fazer entre as carreiras da Advocacia Pública Federal.


F) ADI 5299

Foi ajuizada em maio deste ano contra lei do Estado do Ceará. Aparentemente, situação semelhante à ocorrida na ADI 3857.

Segue notícia do site do STF:

ADI questiona norma que reestruturou carreira de fiscais tributários no Ceará

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5299, com pedido de medida liminar, contra dispositivos da Lei 14.350/2009, do Estado do Ceará, que reestruturaram o Plano de Cargos e Carreiras do Grupo Ocupacional Tributação, Arrecadação e Fiscalização (TAF) da Secretaria da Fazenda do estado.

De acordo com os autos, o artigo 1º da norma modificou dispositivos da Lei 13.778/2006, unificando e renomeando as carreiras de auditor fiscal e gestão tributária, gestão contábil financeira, jurídica e de tecnologia da informação para a carreira única de auditoria e gestão fazendária. Além disso, o artigo 10 da mesma norma assegurou a todos os servidores do Grupo TAF, em caráter excepcional e sob o interesse da administração pública, competência para o lançamento do crédito tributário de mercadoria em trânsito em situação irregular.

O procurador-geral alega que os artigos questionados violam o caput e o inciso II do artigo 37 da Constituição Federal (CF), que tratam da exigência de aprovação prévia em concurso público para investidura em cargo ou emprego público. Segundo Janot, o provimento derivado de cargos é inconstitucional, uma vez que burla o instituto do concurso público e os princípios da impessoalidade e da moralidade.

Janot esclarece que o STF, no julgamento da ADI 3857, já declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei 13.778/2006 por instituírem cargos públicos sob o rótulo de reestruturação de carreira. Os dispositivos inconstitucionais transformaram antigos cargos de nível médio em cargos de nível superior, modificando remuneração e atribuições.

Segundo a ADI, o artigo 2º da Lei 13.778/2006, com redação dada pela Lei 14.350/2009, promoveu nova transformação de carreiras. “Enquadrou servidores de cargos, escolaridades e carreiras diversas em uma única carreira, colocando analistas e técnicos, que são da área meio, na mesma carreira de auditor fiscal da Receita Estadual, que é área fim da Secretaria da Fazenda”, explica. Segundo o procurador-geral, a mudança “mascarou” a criação de dois novos cargos.

Para o procurador-geral, a situação é extremamente grave, especialmente porque todos os integrantes do Grupo TAF passaram a ter prerrogativa de constituição do crédito tributário. O lançamento de crédito tributário, de acordo com Rodrigo Janot, requer conhecimentos específicos sobre todos os requisitos solicitados pela legislação tributária para sua constituição, informações detalhadas sobre infração praticada, enquadramento do produto, aplicação do auto de infração e seus requisitos básicos, e responsabilidade sobre o procedimento realizado. “Assim, o simples fato de ter o conhecimento da situação irregular não torna um servidor capaz de realizar todos os procedimentos necessários para a averiguação do ocorrido”, disse.

Por fim, afirma que o próprio STF consolidou jurisprudência quanto ao tema na Súmula 685, pela qual “é inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido”. Dessa forma, requer a concessão da cautelar para suspender a eficácia dos dispositivos legais especificados. No mérito, pede a declaração de sua inconstitucionalidade.

O relator é o ministro Luís Roberto Barroso.


ADI 1304

Considerando os questionamentos de alguns colegas sobre a impossibilidade de alteração do texto de um eventual Projeto de Lei ou de Medida Provisório enviado pela Administração ao Congresso, por ser matéria de iniciativa do Poder Executivo, é importante ter ciência de que o STF tem como pacífico que é possível, sim, alterações no texto, desde que não haja AUMENTO DE DESPESA. Não há qualquer outra exigência, podendo, por exemplo, haver alterações no texto para incluir a garantia de direitos dos atuais membros, por exemplo.

Nesse sentido, segue um dos julgados encontrados:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MATÉRIA DE INICIATIVA DO PODER EXECUTIVO. EMENDA PARLAMENTAR. AUMENTO DE DESPESA. IMPOSSIBILIDADE. OBSERVÂNCIA DO MODELO FEDERAL. As matérias reservadas à iniciativa do Poder Executivo somente podem ser objeto de emenda na hipótese de não representarem aumento de despesas. Parâmetro de observância cogente pelos Estados da Federação, à luz do princípio da simetria. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.
(ADI 1304, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 11/03/2004, DJ 16-04-2004)


*por Ricardo Wey Rodrigues, Advogado da União

Esclarecimentos sobre a Unificação das quatro carreiras da AGU

Considerando que muitos colegas das quatro carreiras seguem na dúvida sobre a UNIFICAÇÃO, e este blog tem por objetivo justamente ajudar no esclarecimento de todos, seguem alguns comentários:


POR QUE VOTAR "SIM" PARA A UNIFICAÇÃO NA ENQUETE DA AGU E POR QUE ELA NÃO É UM CHEQUE EM BRANCO

O movimento pela UNIFICAÇÃO tem de aproveitar a oportunidade ímpar que temos neste momento. A iniciativa da Administração da AGU no sentido de unificar nos proporcionará algo que nos interessa: uma Medida Provisória, e isso não conseguimos sozinhos. Mas não podemos esquecer: a nossa casa é Congresso

Em 7 anos da atual administração, nunca foi produzido nada de forma democrática e nada de qualidade, que favorecesse as carreiras; agora não ia ser diferente. Contudo, pela primeira vez temos a oportunidade de algo positivo vindo da Administração: uma Medida Provisória (ou talvez uma Lei Ordinária com regime de urgência).

Nesse contexto, votar SIM pela UNIFICAÇÃO na enquete que será aberta pela Administração da AGU não é um "cheque em branco". A Medida Provisória é, sim, um cheque "meio preenchido", mas que precisa da assinatura de quem realmente manda no país: o Congresso. E lá é nossa casa. Temos até uma Frente Parlamentar em Defesa da AGU, constituída recentemente e com amplo apoio dos Deputados.

Por isso, não é dizendo "não" na enquete da Administração da AGU que conseguiremos qualquer coisa; é nos mobilizando no Congresso, com os parlamentares que já nos conhecem (não custa repetir, temos uma frente parlamentar em defesa da AGU!), que conseguiremos todas as garantias do nosso interesse, através das devidas Emendas Substitutivas à Medida Provisória que for enviada. O SIM para a unificação é apenas para conseguirmos uma coisa que não podemos conseguir sozinhos: uma Medida Provisória, mas os detalhes do que estiver escrito nela realmente não importam, isso quem definirá somos nós, no Congresso.  

Portanto, o SIM para a UNIFICAÇÃO não tem nada a ver com cheque em branco. Tem a ver com o primeiro passo de um avanço histórico, no sentido da construção de uma #NOVAAGU, que ainda precisará de outros projetos de lei ou até de emenda constitucional, mas que se mantivermos o trabalho parlamentar, é impossível não conseguirmos.
  
POR QUE NÃO É NECESSÁRIO TER MEDO DE PERDER DIREITOS ESPECÍFICOS DA CARREIRA, OU DE SER OBRIGADO, DE UMA HORA PARA A OUTRA, A TRABALHAR EM OUTRAS ÁREAS ONDE JAMAIS TRABALHOU

Entre todos colegas das 4 carreiras com quem conversei até agora, inclusive delegados e diretores das Associações, é unânime a ideia de que a UNIFICAÇÃO das carreiras deve garantir alguns pontos essenciais.

Primeiramente, é preciso desmistificar a ideia de que, ocorrendo a unificação, os processos passarão a ser divididos por dígito entre todos, sem qualquer divisão de especialização por matéria. Não existe qualquer relação entre uma coisa e outra. A divisão dos advogados por matéria, especialmente nas grandes unidades, certamente continuará ocorrendo.

Seguindo, há um certo consenso sobre as seguintes garantias para os atuais membros:
a) não poderão ser removidos de oficio;
b) terão direito de preferência a todas às de vagas de lotação atualmente vinculadas à sua Procuradoria Geral respectiva; após 5 anos, a cada aposentadoria, a cada vacância de cargo, uma vaga de lotação preferencial é automaticamente transformada em lotação livre;
c) concorrerão em lista de promoção apartada ou promoção automática de todos os membros ativos para o final da carreira;
d) terão preservados todos os direitos especiais de que hoje desfrutam os membros de cada carreira, como as férias de 60 dias de PFNs mais antigos, o plano de saúde dos PBCs, ou a preferência para a remoção de quem está em UDP para AUs e PFNs.

Esses pontos têm sido amplamente aceitos por colegas das 4 carreiras. Portanto, basta que no Congresso, que é a nossa casa, trabalhemos para que isso seja preservado.

Definitivamente não é nos negando a debater, muito menos dizendo desde já "não" para UNIFICAÇÃO que garantiremos essas regras. É dizendo SIM PARA UNIFICAÇÃO e trabalhando juntos no Congresso que obteremos essas garantias.


POR QUE NÃO HÁ RISCO PARA A PARIDADE DOS APOSENTADOS

Não são necessárias muitas divagações. Basta uma leitura da EC 41/2003, que, em suas regras de transição em favor dos aposentados com direito à paridade, garantiu a manutenção da vigência da redação anterior do § 8º do art.40 da CF, que, por sua vez, determinava que os ativos seguem como parâmetro para a paridade, inclusive se os cargos ativos forem transformados ou reclassificados:

EC 41/2003
Art. 2º Observado o disposto no art,4º da Emenda Constitucional nº20, de 15 de dezembro de 1998, é assegurado o direito de opção pela aposentadoria voluntária com proventos calculados de acordo com o art.40, §§3º e 17, da Constituição Federal, àquele que tenha ingressado regularmente em cargo efetivo na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, até a data de publicação daquela Emenda, quando o servidor, cumulativamente:
I - tiver cinqüenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de idade, se mulher;
II - tiver cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria;
III - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que, na data de publicação daquela Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea a deste inciso.
[...]
 § 6º Às aposentadorias concedidas de acordo com este artigo aplica-se o disposto no art. 40, § 8º, da Constituição Federal.

CF 88 (redação anterior)
Art.40.[...]
§ 8º Observado o disposto no art. 37, XI, os proventos de aposentadoria e as pensões serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos aposentados e aos pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei.


 Ou seja, como estamos tratando de transformação de cargos - todos serão transformados em Procurador da União (provavelmente será esse o nome vencedor na enquete) -, não há qualquer risco de perda do direito de paridade para os aposentados.


COMO FICA A ESPECIALIZAÇÃO DA ATUAÇÃO

Pode parecer para alguns que há uma divisão entre as matérias jurídicas em que cada carreira atua, o que justificaria a sua divisão em quatro. Mas se analisarmos mais atentamente, veremos que não existe qualquer especialização das carreiras por matérias jurídicas.

Por exemplo, Procuradores do Banco Central não trabalham apenas com Direito Financeiro ou assemelhados, como podem imaginar alguns. PBC constantemente trabalha em análise de contrato de concessão, multa em matéria ambiental, matéria de servidores e matéria tributária. É verdade que há algumas questões específicas atinentes ao Banco Central que apenas o PBC trata atualmente, mas a quantidades dessas questões é tão pequena comparada ao universo de matérias com que lida o PBC, que não é possível acreditar que nisso esteja a necessidade de existência de uma carreira específica.

Na PGFN, imagina-se, grosso modo, que somente se lida com questões tributárias. Mas ela presta consultoria em questões de Direito Administrativo em grande escala para o Ministério da Fazenda, por exemplo, examinando contratos e licitações daquele Ministério, dentre uma infinidade de outras matérias.

Na PGU, temos diversos Advogados da União que prestam consultoria no Ministério da Previdência Social, tratando sobre qual matéria? Direito Previdenciário, o terror dos Advogados da União neste processo de unificação, matéria que teoricamente seria exclusiva dos Procuradores Federais.

Na carreira de Procurador Federal, trata-se praticamente de todas as matérias do Direito, de tributário a aeroespacial.

Ora, então onde está a especialidade jurídica, essa exclusividade no trato de matérias jurídicas específicas para cada carreira? Não está em lugar nenhum, porque ela simplesmente não existe. A divisão das 4 carreiras é puramente formal.

Não é à toa. Somos todos advogados públicos, que tem por função defender interesses públicos federais, seja em juízo, seja na consultoria, seja no assessoramento. E temos o mesmo cliente: a União, em suas diversas manifestações, centralizada ou descentralizada, mas sempre União.

Não custa lembrar que se fôssemos querer carreiras especializadas por matéria jurídica, deveríamos, em vez de unificar, dividir ainda mais as carreiras, criando uma carreira de Advogado da União de Servidores, Advogado da União de Direito Internacional e assim por diante.

Ao final, temos que a UNIFICAÇÃO não significa que, a partir de agora, todos os processos serão divididos por dígito, entre todos. Isso é um absurdo, não existe menor cabimento acreditar que seria assim. 

O que ocorrerá é, naturalmente, a reunião das Procuradorias Regionais e Gerais em uma Única, que se dividirá internamente por Coordenações e Divisões, conforme a matéria jurídica preponderante, exatamente como já ocorre hoje. Por exemplo, uma PRU já se divide hoje em Coordenação de Servidores, de Trabalhista, etc; com a unificação, ela simplesmente precisará acrescer uma Coordenação de Execução Fiscal, outra de Previdenciário, e assim por diante. UNIFICAÇÃO NÃO SIGNIFICA O FIM DA ESPECIALIZAÇÃO, MUITO PELO CONTRÁRIO, É O COMEÇO DE UMA ESPECIALIZAÇÃO QUE FAÇA ALGUM SENTIDO FUNCIONAL.

E claro, a redução drástica no número de cargos de gestão, que hoje são sobrepostos e totalmente desnecessários (um único exemplo ilustrativo, que certamente pode ser replicado diversas vezes em outros contextos: provavelmente há um Coordenador responsável pela matéria Servidores em cada Regional das quatro carreiras, totalizando 4, que, com a unificação das Regionais, passará a ser apenas 1 único - racionalização da especialização e da estrutura).

 
COMO FICARIA A ATUAÇÃO DOS PROCURADORES COM A CARREIRA UNIFICADA

 A União é uma só, ela se manifesta de diversas formas, centralizada ou descentralizada. A visão de União como simples pessoa jurídica é muito limitadora da amplitude do ente federal. E todas as 4 carreiras tem a mesma função: defender interesses públicos federais, isto é, advogar em favor dos interesses da União como ente federal. Aí está a identidade substancial entre as carreiras, denunciando a divisão puramente formal entre elas. 

 Futuramente, a atuação sobreposta de PFN, PF e AU num mesmo processo, alegando exatamente a mesma coisa, disperdiçando dinheiro público (nossa hora de trabalho custa aproximadamente R$100), quando temos carência de pessoal e de recursos, acabará. 

Sobre a dúvida que levantam: mas e quando uma autarquia tiver alguma disputa com o ente central? 
Ora, primeiramente, basta lembrar que isso já ocorre hoje, entre autarquias, que são todas representadas ao mesmo tempo pela PGF. Isso é facilmente resolvido internamente.
Mas pelo amor do debate, podemos ir adiante. E se uma autarquia fizer questão de ser representada por um órgão diferente do ente central?
Para isso, temos duas ferramentas já existentes e que já são utilizadas, e que resolvem a questão facilmente. Uma, nomeação ad nutum de um Procurador, sempre que uma autarquia demandar uma representação judicial em separado. Assim, se houver uma divergência entre autarquia federal e União ente central, por exemplo, na qual a autarquia formule requerimento de representação em separado, basta a Procuradoria Regional (já unificada) nomear um colega para prestar o serviço. Ambos advogados vão tentar trabalhar da melhor forma para defender seu cliente no caso, como exige seu dever profissional, sob pena de responsabilização civil, criminal e administrativa. Outra, ampliação da Lei de Conciliação e Mediação, publicada em 2015, que transfere à AGU posição central nas conciliações/mediações em âmbito federal - e já há o órgão que trabalha com essa atividade, o CCAF.
Portanto, não há qualquer risco para a defesa da União, muito pelo contrário, o que há é a racionalização da função exercida pela AGU - defesa jurídica dos interesses públicos federais - e das estruturas - atualmente quadruplicadas, com fundamento puramente formal. 


*por Ricardo Wey Rodrigues, Advogado da União