quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Análise jurídica da Unificação das carreiras da AGU

 Sem ter a pretensão de esgotar o tema, mas a fim de contribuir com esclarecimentos que alguns colegas podem achar necessário, segue a exposição abaixo, feita com a ajuda de outro colega:

A) TEXTO CONSTITUCIONAL

 Artigo 131 do CF prevê:
- um grande órgão: AGU
- uma Procuradoria específica, portanto, outro órgão: PGFN
- a necessidade uma Lei Complementar para tratar de ORGANIZAÇÃO e FUNCIONAMENTO

Primeira conclusão: 
não existe previsão de nenhumas das carreiras na Constituição, apenas de órgãos. Portanto, a unificação de carreiras, mantidos os órgãos como são hoje, não exige Emenda Constitucional, pelo menos em princípio.

Seguindo, será que necessita Lei Complementar? Para responder a essa pergunta, devemos saber se "organização e funcionamento" inclui:
-criação,
-transformação,
-transposição,
-extinção de cargos.

A interpretação para isso consta da decisão do STF proferida na ADI 2713, que tratou da transposição dos membros da carreira de Assistente Jurídico para a de Advogado da União.

B) ADI 2713 

A unificação de cargos não viola o art. 131 da CF porque é necessária "uma maior liberdade de atuação legislativa no que diz respeito ao planejamento e à racionalização do quadro de pessoal da Instituição, (...) diante do dinamismo da realidade".
Também não viola o princípio do concurso público, desde que preencha 4 requisitos (são citados como razões de decidir outros dois precedentes do STF:ADI 449, Rel. Min. Carlos Velloso, e ADI 1.591, Rel. Min. Octavio Gallott):
1-compatibilidade funcional - verificada a partir da existência de intercâmbio entre os membros das carreiras, o que sabemos é muito comum tanto nos órgãos consultivos, onde encontramos membros de todos as quatro carreiras exercendo as mesmas funções lado a lado; como nas Procuradorias, inclusive temos como exemplo o próprio AGU, que trabalhou por um bom tempo na PRU da 4ª Região. Além disso, temos o exemplo da instalação das primeiras 150 PSU do Brasil, todas ocupadas inicialmente por Procuradores da Fazenda Nacional. 2-compatibilidade remuneratória - devem ter a mesma remuneração, como ocorre hoje entre as quatro carreiras 3-equivalência dos requisitos para prestar o concurso - não se trata de matérias que caem nas provas, mas de requisitos para prestar o concurso, isto é, mesma escolaridade, mesma formação, etc. As quatro carreiras da AGU possuem o mesmo sistema de provas e títulos.
4-completa identidade substancial entre os cargos

Aqui é a maior resistência de quem é contrário à unificação, especialmente por causa da atuação dos Procuradores Federais, que seria direcionada "apenas à defesa de autarquia e fundações". 

4.1)
Contudo, o STF neste leading case fez a análise da "identidade substancial" a partir das funções previstas para cada uma das carreiras na Lei. No caso dos PFs, tem-se a MP2229/2001, que criou a carreira de Procurador Federal, dispondo em seu art.37:

São atribuições dos Procuradores Federais:
I - a representação judicial e extrajudicial da União, quanto às suas atividades descentralizadas a cargo de autarquias e fundações públicas, bem como a representação judicial e extrajudicial dessas entidades;
II - as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos à União, em suas referidas atividades descentralizadas, assim como às autarquias e às fundações federais;

[Similaridade entre Advogados da União e Procuradores Federais)
III - a apuração da liquidez e certeza dos créditos,(...) inscrevendo-os em dívida ativa (...);
[Similaridade entre Procuradores da Fazenda Nacional e Procuradores Federais]

4.2)
 Nesse ponto, mais uma vez poderiam alguns contrários à unificação dizer que, embora a MP fale que os Procuradores Federais têm a função de "defender a União", isso seria apenas jogo de palavras, pois as autarquias e as fundações não poderiam se confundir com a União órgão central, o que incluiria representantes jurídicas dessas entidades. Em resposta a isso, teríamos de fugir da forma de decidir fixada pelo STF. Mas podemos sim ir adiante, a bem do debate. Digamos que o STF reveja a posição desse precedente dos Assistentes Jurídicos e decida não apenas analisar a lei que estabelece as funções de cada cargo, mas tente analisar o que realmente cada carreira faz. 

Primeiro:
essa autonomia não está prevista na Constituição, mas nas leis, e os conceitos utilizados vêm na maior parte da Doutrina.

Segundo:
a autonomia que é garantida às autarquias e às fundações (deixando de lado o próprio equívoco do termo "autonomia" para o caso) é exclusivamente para AUTO-ADMINISTRAÇÃO DE SUAS ATIVIDADES, a AUTONOMIA GERENCIAL.


 
Consultando os maiores administrativistas do Brasil, tais como Hely Lopes Meirelles, Maria Di Pietro e outros, como não poderia ser diferente, em nenhum momento se encontra qualquer afirmação no sentido de que a prestação do serviço jurídico faria parte da autonomia de administração, a autonomia gerencial. Portanto, a não ser que queira se inventar o Direito, a prestação do serviço jurídico não faz parte da autonomia gerencial garantida às autarquias e fundações.

E por que "não poderia ser diferente"? Porque a prestação do serviço jurídico é especial em relação a qualquer outra atividade do seu empregador, seja esse empregador a União ente central, seja esse empregador uma autarquia ou fundação, seja esse empregador uma pessoa jurídica privada qualquer. Com efeito, todo advogado, privado ou público, possui INDEPENDÊNCIA TÉCNICA para o exercício de suas atividades. Isso é garantido expressamente em favor dos advogados empregados  (art.18 da LOAB- Art. 18. A relação de emprego, na qualidade de advogado, não retira a isenção técnica nem reduz a independência profissional inerentes à advocacia), para acabar com qualquer dúvidas que poderiam existir quanto a esse ponto.

Ou seja, sabendo que o advogado presta o serviço de defesa jurídica de interesses em juízo e de consultoria e assessoramento, jamais um advogado como é o Procurador Federal poderia ser considerado como submetido à gerência autônoma de um chefe de autarquia, por exemplo, pois a autarquia nada mais é do que um cliente do Procurador Federal (e são muitos, mais de 100 autarquias e fundações), que vai até ele em busca de serviço jurídico para auxiliar em sua atividade-fim, mas isso em nenhum momento retira desse Procurador Federal a total independência técnica, e não o submete de forma alguma à gerência das autarquias, como se fosse um técnico qualquer. Repito: os advogados e procuradores não são qualquer empregado, são diferenciados e possuem independência técnica, não submetendo de forma alguma o seu trabalho à gerência, seja da autarquia, seja da União ente central.

Apesar de já ser suficiente, é possível avançar ainda mais no argumento: essa autonomia técnica é ainda mais gritante na Administração Pública. Tanto União ente central, quanto autarquia, quanto universidades, obedecem a LEGALIDADE ESTRITA; ou seja, as autarquias não podem fazer nada que não esteja previsto na legislação; e os Procuradores Federais não podem interpretar em favor do seu cliente nada do que esteja fora da legislação. 
Desse modo, onde poderia haver espaço para um administrador de autarquia, universidade ou qualquer outro utilizar-se de sua autonomia gerencial e solicitar que um Procurador Federal prestasse o serviço jurídico desse ou daquele modo? Esse espaço não existe.

Na prática, no dia-a-dia, basta lembrar que, quando fazemos uma peça, seja um parecer, seja uma contestação, não pensamos "como o governo quer isso e aquilo, vou escrever tal coisa". Com efeito, analisamos as leis que se aplicam ao caso e tentamos interpretá-las da forma mais favorável ao nosso cliente, não interessa quem ele seja. Essa é a função de um advogado e é o que fazemos diariamente, sob pena de responsabilização civil, criminal e administrativa. No caso dos advogados públicos, isso é a independência técnica trabalhando dentro dos limites da legalidade estrita. 
Desse modo, tendo em vista então que os serviços jurídicos definitivamente não compõem a estrutura essencial de uma autarquia ou fundação, nem mesmo da estrutura da Administração da União como ente central, pois eles são prestados por advogados, atualmente em 4 carreiras, que possuem autonomia técnica por força da Lei da OAB e da própria natureza da atividade histórica da advocacia, então conclui-se facilmente que a essência, a substância de todas as 4 carreiras é a mesma: defesa de interesses públicos federais em Juízo e consultoria e assessoramento de entes federais extrajudicialmente. Desse modo, há identidade substancial entre os cargos, permitindo a unificação também por esse critério.
4.3)
Portanto, em conclusão, com base no precedente acima, seria possível a unificação das carreiras da AGU por MP-LO, desde que mantidas as estruturas organizacionais, que dependem de LC e/ou EC.
 

C) ADI 484

Estavam sendo impugnadas duas leis estaduais do Estado do Paraná que organizavam, numa carreira de Advogado Especial do Estado do Paraná, aqueles advogados, assistentes jurídicos etc. que, na época da promulgação da Constituição do Estado do Paraná, prestavam assessoramento jurídico aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e representavam as autarquias e fundações públicas.

A ADI foi julgada improcedente, tendo em vista que as leis apenas criavam a referida carreira para acomodar esses que exerciam, na época da promulgação da CE, aquelas atividades já referidas. Entendeu-se que essa carreira de Advogado Especial não poderia receber novos membros por concurso público, pois isso significaria usurpar definitivamente competências dos Procuradores do Estado do Paraná. 
Não parece ter peso contra a unificação. Pelo contrário, a criação dessa carreira de advogado especial veio somente para acomodar uma situação transitória, que deixaria de existir tão logo os ocupantes desses cargos viessem a se aposentar. A partir de então, as atribuições seriam dos Procuradores do Estado, carreira única, inclusive as de consultoria e assessoramento jurídicos às autarquias e fundações e a respectiva representação judicial dessas entidades.


D) ADI 3415

Nesse caso, a notícia no site do Supremo fala por si mesma. Era um caso de unificação de cargo de comissário de polícia com o de delegado. Pura falácia de quem quer comparar coisas absolutamente diferentes:

Quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Unificação das carreiras de delegado e comissário de polícia no AM é inconstitucional

O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucionais normas do Estado do Amazonas que unificaram as carreiras de delegado de polícia e comissário. Segundo o entendimento adotado pela Corte no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3415, a medida representou burla à exigência do concurso público.

“Muito diversamente do que houve nos precedentes em que este Supremo Tribunal Federal admitiu a unificação de carreiras, quando se apurou que a distinção entre os cargos fusionados era meramente nominal, há aqui substanciais diferenças entre um e outro”, afirmou o relator da ADI, ministro Teori Zavascki. Criado por meio de lei editada em 2001, o cargo de comissário, além de ter remuneração muito inferior à do cargo de delegado de polícia, apresentava natureza isolada, organizando-se em classe única.

O cargo surgiu com exigências semelhantes ao de delegado, como formação superior em Direito, inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e curso na academia de polícia. Entre as atribuições do cargo, havia a previsão, de forma excepcional, do exercício de funções de delegado de Polícia no interior ou de delegado plantonista. Contudo, as Leis estaduais 2.875/2004 e 2.917/2004 instituíram um grupo ocupacional denominado de autoridade policial, composto por titulares dos cargos de delegado e de comissário, conferindo-lhes atribuições idênticas e equiparando a remuneração de comissário à de delegado da 5ª Classe.

Segundo o argumento adotado pelo relator, as diferenças entre os cargos não são irrisórias, existindo subordinação hierárquica e não cabendo ao comissário a chefia da delegacia de polícia, a não ser em caráter temporário. Há uma diferença de responsabilidades e de perspectiva de promoções. Aqueles que prestaram o primeiro concurso para o cargo em 2001, diz o relator, tinham ciência das limitações da função.

“Não tem credibilidade a afirmação de que as leis impugnadas operaram mera racionalização administrativa dos quadros da polícia do Estado do Amazonas. A forma como foi conduzido o rearranjo administrativo revela que houve de fato burla ao postulado do concurso público”, concluiu.

O voto do ministro Teori Zavascki, pela inconstitucionalidade de dispositivos das Leis estaduais 2.875/2004 e 2.917/2004, nos termos do pedido feito pela Procuradoria Geral da República (autora da ADI), foi acompanhado por unanimidade.



E) ADI 3857

Impugnava lei do Estado do Ceará que realizava a transposição de cargos de auditor adjunto e de técnico da fazenda estadual para um novo cargo de Auditor Adjunto.

O problema, aqui, foi que os cargos anteriores possuíam atribuições distintas da do novo, remuneração distinta (inclusive entre os dois antigos), além de possuir requisito de escolaridade diferente (nas antigas, nível médio; na nova, nível superior).

Assim, o STF considerou que se tratava de burla ao princípio do concurso público, já que o novo cargo tinha atribuições distintas, requisito de ingresso distinto etc.

Ou seja, totalmente diferente da unificação que se pretende fazer entre as carreiras da Advocacia Pública Federal.


F) ADI 5299

Foi ajuizada em maio deste ano contra lei do Estado do Ceará. Aparentemente, situação semelhante à ocorrida na ADI 3857.

Segue notícia do site do STF:

ADI questiona norma que reestruturou carreira de fiscais tributários no Ceará

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5299, com pedido de medida liminar, contra dispositivos da Lei 14.350/2009, do Estado do Ceará, que reestruturaram o Plano de Cargos e Carreiras do Grupo Ocupacional Tributação, Arrecadação e Fiscalização (TAF) da Secretaria da Fazenda do estado.

De acordo com os autos, o artigo 1º da norma modificou dispositivos da Lei 13.778/2006, unificando e renomeando as carreiras de auditor fiscal e gestão tributária, gestão contábil financeira, jurídica e de tecnologia da informação para a carreira única de auditoria e gestão fazendária. Além disso, o artigo 10 da mesma norma assegurou a todos os servidores do Grupo TAF, em caráter excepcional e sob o interesse da administração pública, competência para o lançamento do crédito tributário de mercadoria em trânsito em situação irregular.

O procurador-geral alega que os artigos questionados violam o caput e o inciso II do artigo 37 da Constituição Federal (CF), que tratam da exigência de aprovação prévia em concurso público para investidura em cargo ou emprego público. Segundo Janot, o provimento derivado de cargos é inconstitucional, uma vez que burla o instituto do concurso público e os princípios da impessoalidade e da moralidade.

Janot esclarece que o STF, no julgamento da ADI 3857, já declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei 13.778/2006 por instituírem cargos públicos sob o rótulo de reestruturação de carreira. Os dispositivos inconstitucionais transformaram antigos cargos de nível médio em cargos de nível superior, modificando remuneração e atribuições.

Segundo a ADI, o artigo 2º da Lei 13.778/2006, com redação dada pela Lei 14.350/2009, promoveu nova transformação de carreiras. “Enquadrou servidores de cargos, escolaridades e carreiras diversas em uma única carreira, colocando analistas e técnicos, que são da área meio, na mesma carreira de auditor fiscal da Receita Estadual, que é área fim da Secretaria da Fazenda”, explica. Segundo o procurador-geral, a mudança “mascarou” a criação de dois novos cargos.

Para o procurador-geral, a situação é extremamente grave, especialmente porque todos os integrantes do Grupo TAF passaram a ter prerrogativa de constituição do crédito tributário. O lançamento de crédito tributário, de acordo com Rodrigo Janot, requer conhecimentos específicos sobre todos os requisitos solicitados pela legislação tributária para sua constituição, informações detalhadas sobre infração praticada, enquadramento do produto, aplicação do auto de infração e seus requisitos básicos, e responsabilidade sobre o procedimento realizado. “Assim, o simples fato de ter o conhecimento da situação irregular não torna um servidor capaz de realizar todos os procedimentos necessários para a averiguação do ocorrido”, disse.

Por fim, afirma que o próprio STF consolidou jurisprudência quanto ao tema na Súmula 685, pela qual “é inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido”. Dessa forma, requer a concessão da cautelar para suspender a eficácia dos dispositivos legais especificados. No mérito, pede a declaração de sua inconstitucionalidade.

O relator é o ministro Luís Roberto Barroso.


ADI 1304

Considerando os questionamentos de alguns colegas sobre a impossibilidade de alteração do texto de um eventual Projeto de Lei ou de Medida Provisório enviado pela Administração ao Congresso, por ser matéria de iniciativa do Poder Executivo, é importante ter ciência de que o STF tem como pacífico que é possível, sim, alterações no texto, desde que não haja AUMENTO DE DESPESA. Não há qualquer outra exigência, podendo, por exemplo, haver alterações no texto para incluir a garantia de direitos dos atuais membros, por exemplo.

Nesse sentido, segue um dos julgados encontrados:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MATÉRIA DE INICIATIVA DO PODER EXECUTIVO. EMENDA PARLAMENTAR. AUMENTO DE DESPESA. IMPOSSIBILIDADE. OBSERVÂNCIA DO MODELO FEDERAL. As matérias reservadas à iniciativa do Poder Executivo somente podem ser objeto de emenda na hipótese de não representarem aumento de despesas. Parâmetro de observância cogente pelos Estados da Federação, à luz do princípio da simetria. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.
(ADI 1304, Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 11/03/2004, DJ 16-04-2004)


*por Ricardo Wey Rodrigues, Advogado da União

Esclarecimentos sobre a Unificação das quatro carreiras da AGU

Considerando que muitos colegas das quatro carreiras seguem na dúvida sobre a UNIFICAÇÃO, e este blog tem por objetivo justamente ajudar no esclarecimento de todos, seguem alguns comentários:


POR QUE VOTAR "SIM" PARA A UNIFICAÇÃO NA ENQUETE DA AGU E POR QUE ELA NÃO É UM CHEQUE EM BRANCO

O movimento pela UNIFICAÇÃO tem de aproveitar a oportunidade ímpar que temos neste momento. A iniciativa da Administração da AGU no sentido de unificar nos proporcionará algo que nos interessa: uma Medida Provisória, e isso não conseguimos sozinhos. Mas não podemos esquecer: a nossa casa é Congresso

Em 7 anos da atual administração, nunca foi produzido nada de forma democrática e nada de qualidade, que favorecesse as carreiras; agora não ia ser diferente. Contudo, pela primeira vez temos a oportunidade de algo positivo vindo da Administração: uma Medida Provisória (ou talvez uma Lei Ordinária com regime de urgência).

Nesse contexto, votar SIM pela UNIFICAÇÃO na enquete que será aberta pela Administração da AGU não é um "cheque em branco". A Medida Provisória é, sim, um cheque "meio preenchido", mas que precisa da assinatura de quem realmente manda no país: o Congresso. E lá é nossa casa. Temos até uma Frente Parlamentar em Defesa da AGU, constituída recentemente e com amplo apoio dos Deputados.

Por isso, não é dizendo "não" na enquete da Administração da AGU que conseguiremos qualquer coisa; é nos mobilizando no Congresso, com os parlamentares que já nos conhecem (não custa repetir, temos uma frente parlamentar em defesa da AGU!), que conseguiremos todas as garantias do nosso interesse, através das devidas Emendas Substitutivas à Medida Provisória que for enviada. O SIM para a unificação é apenas para conseguirmos uma coisa que não podemos conseguir sozinhos: uma Medida Provisória, mas os detalhes do que estiver escrito nela realmente não importam, isso quem definirá somos nós, no Congresso.  

Portanto, o SIM para a UNIFICAÇÃO não tem nada a ver com cheque em branco. Tem a ver com o primeiro passo de um avanço histórico, no sentido da construção de uma #NOVAAGU, que ainda precisará de outros projetos de lei ou até de emenda constitucional, mas que se mantivermos o trabalho parlamentar, é impossível não conseguirmos.
  
POR QUE NÃO É NECESSÁRIO TER MEDO DE PERDER DIREITOS ESPECÍFICOS DA CARREIRA, OU DE SER OBRIGADO, DE UMA HORA PARA A OUTRA, A TRABALHAR EM OUTRAS ÁREAS ONDE JAMAIS TRABALHOU

Entre todos colegas das 4 carreiras com quem conversei até agora, inclusive delegados e diretores das Associações, é unânime a ideia de que a UNIFICAÇÃO das carreiras deve garantir alguns pontos essenciais.

Primeiramente, é preciso desmistificar a ideia de que, ocorrendo a unificação, os processos passarão a ser divididos por dígito entre todos, sem qualquer divisão de especialização por matéria. Não existe qualquer relação entre uma coisa e outra. A divisão dos advogados por matéria, especialmente nas grandes unidades, certamente continuará ocorrendo.

Seguindo, há um certo consenso sobre as seguintes garantias para os atuais membros:
a) não poderão ser removidos de oficio;
b) terão direito de preferência a todas às de vagas de lotação atualmente vinculadas à sua Procuradoria Geral respectiva; após 5 anos, a cada aposentadoria, a cada vacância de cargo, uma vaga de lotação preferencial é automaticamente transformada em lotação livre;
c) concorrerão em lista de promoção apartada ou promoção automática de todos os membros ativos para o final da carreira;
d) terão preservados todos os direitos especiais de que hoje desfrutam os membros de cada carreira, como as férias de 60 dias de PFNs mais antigos, o plano de saúde dos PBCs, ou a preferência para a remoção de quem está em UDP para AUs e PFNs.

Esses pontos têm sido amplamente aceitos por colegas das 4 carreiras. Portanto, basta que no Congresso, que é a nossa casa, trabalhemos para que isso seja preservado.

Definitivamente não é nos negando a debater, muito menos dizendo desde já "não" para UNIFICAÇÃO que garantiremos essas regras. É dizendo SIM PARA UNIFICAÇÃO e trabalhando juntos no Congresso que obteremos essas garantias.


POR QUE NÃO HÁ RISCO PARA A PARIDADE DOS APOSENTADOS

Não são necessárias muitas divagações. Basta uma leitura da EC 41/2003, que, em suas regras de transição em favor dos aposentados com direito à paridade, garantiu a manutenção da vigência da redação anterior do § 8º do art.40 da CF, que, por sua vez, determinava que os ativos seguem como parâmetro para a paridade, inclusive se os cargos ativos forem transformados ou reclassificados:

EC 41/2003
Art. 2º Observado o disposto no art,4º da Emenda Constitucional nº20, de 15 de dezembro de 1998, é assegurado o direito de opção pela aposentadoria voluntária com proventos calculados de acordo com o art.40, §§3º e 17, da Constituição Federal, àquele que tenha ingressado regularmente em cargo efetivo na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, até a data de publicação daquela Emenda, quando o servidor, cumulativamente:
I - tiver cinqüenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de idade, se mulher;
II - tiver cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria;
III - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:
a) trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e
b) um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que, na data de publicação daquela Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea a deste inciso.
[...]
 § 6º Às aposentadorias concedidas de acordo com este artigo aplica-se o disposto no art. 40, § 8º, da Constituição Federal.

CF 88 (redação anterior)
Art.40.[...]
§ 8º Observado o disposto no art. 37, XI, os proventos de aposentadoria e as pensões serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos aposentados e aos pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei.


 Ou seja, como estamos tratando de transformação de cargos - todos serão transformados em Procurador da União (provavelmente será esse o nome vencedor na enquete) -, não há qualquer risco de perda do direito de paridade para os aposentados.


COMO FICA A ESPECIALIZAÇÃO DA ATUAÇÃO

Pode parecer para alguns que há uma divisão entre as matérias jurídicas em que cada carreira atua, o que justificaria a sua divisão em quatro. Mas se analisarmos mais atentamente, veremos que não existe qualquer especialização das carreiras por matérias jurídicas.

Por exemplo, Procuradores do Banco Central não trabalham apenas com Direito Financeiro ou assemelhados, como podem imaginar alguns. PBC constantemente trabalha em análise de contrato de concessão, multa em matéria ambiental, matéria de servidores e matéria tributária. É verdade que há algumas questões específicas atinentes ao Banco Central que apenas o PBC trata atualmente, mas a quantidades dessas questões é tão pequena comparada ao universo de matérias com que lida o PBC, que não é possível acreditar que nisso esteja a necessidade de existência de uma carreira específica.

Na PGFN, imagina-se, grosso modo, que somente se lida com questões tributárias. Mas ela presta consultoria em questões de Direito Administrativo em grande escala para o Ministério da Fazenda, por exemplo, examinando contratos e licitações daquele Ministério, dentre uma infinidade de outras matérias.

Na PGU, temos diversos Advogados da União que prestam consultoria no Ministério da Previdência Social, tratando sobre qual matéria? Direito Previdenciário, o terror dos Advogados da União neste processo de unificação, matéria que teoricamente seria exclusiva dos Procuradores Federais.

Na carreira de Procurador Federal, trata-se praticamente de todas as matérias do Direito, de tributário a aeroespacial.

Ora, então onde está a especialidade jurídica, essa exclusividade no trato de matérias jurídicas específicas para cada carreira? Não está em lugar nenhum, porque ela simplesmente não existe. A divisão das 4 carreiras é puramente formal.

Não é à toa. Somos todos advogados públicos, que tem por função defender interesses públicos federais, seja em juízo, seja na consultoria, seja no assessoramento. E temos o mesmo cliente: a União, em suas diversas manifestações, centralizada ou descentralizada, mas sempre União.

Não custa lembrar que se fôssemos querer carreiras especializadas por matéria jurídica, deveríamos, em vez de unificar, dividir ainda mais as carreiras, criando uma carreira de Advogado da União de Servidores, Advogado da União de Direito Internacional e assim por diante.

Ao final, temos que a UNIFICAÇÃO não significa que, a partir de agora, todos os processos serão divididos por dígito, entre todos. Isso é um absurdo, não existe menor cabimento acreditar que seria assim. 

O que ocorrerá é, naturalmente, a reunião das Procuradorias Regionais e Gerais em uma Única, que se dividirá internamente por Coordenações e Divisões, conforme a matéria jurídica preponderante, exatamente como já ocorre hoje. Por exemplo, uma PRU já se divide hoje em Coordenação de Servidores, de Trabalhista, etc; com a unificação, ela simplesmente precisará acrescer uma Coordenação de Execução Fiscal, outra de Previdenciário, e assim por diante. UNIFICAÇÃO NÃO SIGNIFICA O FIM DA ESPECIALIZAÇÃO, MUITO PELO CONTRÁRIO, É O COMEÇO DE UMA ESPECIALIZAÇÃO QUE FAÇA ALGUM SENTIDO FUNCIONAL.

E claro, a redução drástica no número de cargos de gestão, que hoje são sobrepostos e totalmente desnecessários (um único exemplo ilustrativo, que certamente pode ser replicado diversas vezes em outros contextos: provavelmente há um Coordenador responsável pela matéria Servidores em cada Regional das quatro carreiras, totalizando 4, que, com a unificação das Regionais, passará a ser apenas 1 único - racionalização da especialização e da estrutura).

 
COMO FICARIA A ATUAÇÃO DOS PROCURADORES COM A CARREIRA UNIFICADA

 A União é uma só, ela se manifesta de diversas formas, centralizada ou descentralizada. A visão de União como simples pessoa jurídica é muito limitadora da amplitude do ente federal. E todas as 4 carreiras tem a mesma função: defender interesses públicos federais, isto é, advogar em favor dos interesses da União como ente federal. Aí está a identidade substancial entre as carreiras, denunciando a divisão puramente formal entre elas. 

 Futuramente, a atuação sobreposta de PFN, PF e AU num mesmo processo, alegando exatamente a mesma coisa, disperdiçando dinheiro público (nossa hora de trabalho custa aproximadamente R$100), quando temos carência de pessoal e de recursos, acabará. 

Sobre a dúvida que levantam: mas e quando uma autarquia tiver alguma disputa com o ente central? 
Ora, primeiramente, basta lembrar que isso já ocorre hoje, entre autarquias, que são todas representadas ao mesmo tempo pela PGF. Isso é facilmente resolvido internamente.
Mas pelo amor do debate, podemos ir adiante. E se uma autarquia fizer questão de ser representada por um órgão diferente do ente central?
Para isso, temos duas ferramentas já existentes e que já são utilizadas, e que resolvem a questão facilmente. Uma, nomeação ad nutum de um Procurador, sempre que uma autarquia demandar uma representação judicial em separado. Assim, se houver uma divergência entre autarquia federal e União ente central, por exemplo, na qual a autarquia formule requerimento de representação em separado, basta a Procuradoria Regional (já unificada) nomear um colega para prestar o serviço. Ambos advogados vão tentar trabalhar da melhor forma para defender seu cliente no caso, como exige seu dever profissional, sob pena de responsabilização civil, criminal e administrativa. Outra, ampliação da Lei de Conciliação e Mediação, publicada em 2015, que transfere à AGU posição central nas conciliações/mediações em âmbito federal - e já há o órgão que trabalha com essa atividade, o CCAF.
Portanto, não há qualquer risco para a defesa da União, muito pelo contrário, o que há é a racionalização da função exercida pela AGU - defesa jurídica dos interesses públicos federais - e das estruturas - atualmente quadruplicadas, com fundamento puramente formal. 


*por Ricardo Wey Rodrigues, Advogado da União